Se não deu tudo certo, é porque ainda não chegou no final
Olá, caro leitor.
Parece que estou estranhando a escrita, como estranho a mim mesma. É como se eu escrevesse coisas lindas, textos em que eu listo exatamente o que tenho que fazer e que me fazem perceber que já sei qual caminho seguir, mas eu faço isso toda vez, e em todas elas eu fui escrever justamente porque estava angustiada por não cumprir nada do que prometi fazer. Eu estranho o que escrevo, porque não escrevo sobre a realidade, sendo que é isso o que eu gosto de fazer. Mas eu não posso em sã consciência me deixar escrever, e nem, principalmente, pensar que as coisas devem permanecer como estão.
Eu sou uma adolescente de quase 16 anos, que está indo para o 2º ano do Ensino Médio. Em outras palavras, uma criatura sendo arrastada para uma espécie de abismo, e tudo o que faço é olhar para trás, para os anos da minha vida em que tinha amigos, tirava notas boas, me divertia e chorava, sem pensar no depois, ou para o outro lado do abismo, em que há uma Julia formada na faculdade, quem dera professora, e talvez casada.
Pode até parecer um bom destino, e todos me dizem que é "só" construir uma escada minimamente confiável, ou, se eu me esforçar mais, uma asa-delta, que eu chego lá, mas eu só vejo o abismo mesmo. Só eu e o abismo, eu, e a morte iminente. Mas é, tudo bem... eu prezo por fazer os dois tipos de escrita descritos pelo meu amado Iñaki Godoy, em uma entrevista para um podcast. Ele disse que existe a escrita para si mesmo, e a para os outros, que costuma ser mais otimista. Eu não acho que ler um texto que apenas descreve as coisas ruins que você pode estar sentindo, mas não te inspira a melhorar, te ajude de fato a melhorar. Então eu devo dizer que:
Há alguns dias, eu ouvi o mais recente episódio do podcast do Saia Justa, em que sua apresentadora e uma das integrantes se despedem do programa. Em determinado momento, quando a pauta era "Fim de uma era", uma das "ex-saias" convidadas, a jornalista e ex-alcoolista Barbara Gancia, de 66 anos, disse uma coisa que me tocou e me acalmou, como poucas realmente conseguem fazer.
Ela disse que já passou por muita coisa na vida, momentos difíceis, e teve que lidar com as consequências de muitos erros que cometeu, mas que mesmo assim, de um jeito ou de outro, tudo sempre deu certo no fim, e que, "se ainda não deu tudo certo, é porque ainda não chegou no fim". É claro, esse é um relato de uma pessoa muito privilegiada, pois coisas são negadas a pessoas a todo momento, por motivos que não fazem o menor sentido. Mas acho que quem tem o privilégio de ter uma coisa tão psicológica como principal preocupação, deve fazer algo útil com isso, racionalizar isso. E a frase da Barbara pode ajudar.
Ela também se conecta perfeitamente com que disse Natália Souza, apresentadora do também podcast "Para dar nome às coisas", quando pediram para ela falar sobre se sentir estagnado na vida. Ela propôs que nos perguntássemos se em momentos assim, estamos mesmo parados, sem fazer o que devemos fazer, ou se na verdade estamos fazendo muitos movimentos, mas que fazem parte de uma longa série de outros, um processo, como a construção de uma casa.
Com isso, acho que podemos concluir que existem momentos da vida em que demora, mais ou menos, dependo dos recursos que cada um tem disponíveis (e que também podem não ser só materiais, mas também aspectos psicológicos, como transtornos e déficits) para que cheguemos ao outro lado do abismo. Momentos desconfortáveis, em que realmente não nos sentimos em casa, mas é bom considerar a paciência, é bom eu olhar para a bendita lista de afazeres que escrevi e aceitar que completá-la é, apesar de não parecer, tudo o que eu mais quero fazer.
Não tem mais o que te dizer, leitor que me aguentou até aqui. Nem mais o que escrever em um dos meus infindos caderninhos. Eu simplesmente tenho muito o que fazer.
------------------
Episódios que citei e que recomendo fortemente:
Saia Justa: https://open.spotify.com/episode/1W5JXeBPEZjV7oZhSbFAmX?si=HBycd0MeTMKa17UiFfb4Ig
Para dar nome às coisas: https://open.spotify.com/episode/41fgIc0CyhCyymP7MFeL97?si=vJgxsLoTTESUHsJwVSJfoQ
Comentários
Postar um comentário